PORQUE AS CRIANÇAS ME ASSUSTAM

                          Entra ano, sai ano, e a polêmica em torno do aborto está sempre presente. Os que defendem a lei que o permite dizem que as mulheres têm o direito de decidir o que é melhor para elas (embora elas não tenham pensado no que era melhor quando estavam virando os "olhinhos"), os que defendem a proibição, alegam que nenhum homem tem o direito de tirar uma vida (embora eles não pensem nisso quando mandam pessoas para morrer nas guerras). Na humilde opinião de uma pessoa cuja opinião não interessa a ninguém (neste caso "eu"), o aborto é, sem dúvida, um crime hediondo quando analisado de forma geral, porém, existem casos em que essa é a escolha mais certa, ou seja, até mesmo na minha avaliação o assunto é polêmico. De qualquer forma eu sou a favor de se evitar a gravidez em qualquer hipótese. Eu penso que ninguém mais deveria trazer crianças a esse mundo, primeiro - analisando de forma geral e absoluta - eu não acho justo trazer alguém a um mundo que caminha para o fim e, segundo - analisando de forma egoísta e particular - eu tenho medo das crianças.

             Meu problema com elas começou muito cedo, ainda na minha adolescência, ou seja, isso faz realmente muito, muito, muito tempo. O problema é que, por algum motivo que eu até hoje desconheço, todas as pessoas sempre acharam que eu fosse uma "babá quase perfeita" e se aproveitavam desse ledo engano para deixarem sempre seus "anjinhos" aos meus cuidados. Isso começou com sobrinhos e de uma forma perturbadora passou a acontecer com todas as pessoas que, de alguma forma, tinham a oportunidade de se livrar de seus rebentos por alguns momentos, empurrando eles para os meus braços. Eu, como sempre fui um pouco passivo em relação ao que as pessoas esperavam de mim, aceitava resignado a missão de cuidar dessas crianças que não tinham culpa na questão. Acontece que as crianças sempre enxergaram em mim alguém mais novo e com menos autoridade do que elas, ou seja, eu sempre fui um alvo perfeito para a arte do terrorismo infantil. Sendo assim, elas sempre me atiravam coisas, me desobedeciam, me xingavam, alguns sobrinhos já até me ameaçaram de morte, parece mentira, mas não é. O fato de não poder aplicar aos filhos dos outros as boas regras de educação que meus pais me ensinaram me tornava impotente diante dessas pessoas tão pequenas e tão poderosas e eficazes na arte de acusar, encenar, torturar e aterrorizar. Ou seja, o meu trauma incurável em relação às crianças é uma coisa com fundamento, afinal elas sempre me maltrataram e ainda hoje, sempre que alguma delas tem oportunidade, me chuta a canela, me mostra a língua e, aqueles que já ultrapassaram a idade da inocência, que hoje em dia só vai até aos 6 anos, me fazem gestos ousados com o dedo médio apontando em minha direção.

            Tudo isso torna-me, sem dúvida, um grande defensor dos métodos contraceptivos. Não é que eu não goste de crianças, eu adoro vê-las em fotos, ou dormindo, ou a uma distância mínima e segura de dez metros, mas além de todos os problemas que envolvem a violência infantil contra a minha pessoa, existe um fato que as torna ainda mais perigosas, as crianças falam, e hoje em dia elas tomam decisões. Na minha infância, quando a família estava reunida e meus pais conversavam sobre qualquer assunto, a não ser que se dirigissem a mim, eu tinha direito a duas coisas: fingir que não ouvia o que falavam e, em hipótese alguma, interferir na conversa. Atualmente os pais se calam e os filhos falam, são eles que decidem o que vão comer, quando vão comer, onde querem ou não ir e sobre o que os pais devem conversar. Se não fossem me chamar de louco eu diria que existe uma conspiração infantil para escravizar os adultos e dominar o mundo, mas isso é apenas uma suspeita e eu tenho medo que, se as crianças descobrirem que eu conheço os seus planos, façam uma rebelião, me capturem e voltem a me chutar a canela, me atirar coisas e me ameaçarem de morte. Deus que me livre de passar por tal sofrimento novamente!

Naturalmente é tudo uma brincadeira, mas fala sério se essas crianças aí embaixo não provocam pânico em qualquer ser humano?